Como a música age no cérebro e fortalece intervenções em neurodesenvolvimento

A musicoterapia ativa múltiplas áreas do cérebro, favorece neuroplasticidade e melhora comunicação, regulação emocional e aprendizagem em pessoas neurodivergentes.

Tags: Autismo | Neurodesenvolvimento | Musicoterapia | Neurociência | Intervenção Terapêutica

 

O que sabemos sobre música e cérebro

A música — ritmo, melodia, harmonia — não é apenas arte ou entretenimento: ela mobiliza estruturas cerebrais complexas e diversas. Ouvir ou fazer música ativa redes que envolvem percepção auditiva, emoção, memória, movimento, recompensa e cognição. 

Segundo revisão da literatura, a prática musical pode provocar mudanças estruturais e funcionais no cérebro que são reflexo da neuroplasticidade. 

Para pessoas com desafios de neurodesenvolvimento, isso significa que a música pode funcionar como “ponte” para desenvolver capacidades de linguagem, sociabilidade, regulação emocional e funções cognitivas, mesmo quando outras vias (verbais, motoras, sensoriais) estão mais comprometidas. 

 

Mecanismos neurais ativados pela música

Aqui estão os principais mecanismos por trás dos efeitos terapêuticos da música:

  • Ativação multisensorial e multimodal: Ao ouvir ou fazer música, há envolvimento simultâneo de córtices auditivos, áreas motoras (quando há movimento ou ritmo), estruturas de memória (como o hipocampo) e áreas emocionais.

  • Sistema de recompensa e regulação emocional: A música ativa circuitos cerebrais ligados a prazer e recompensa, como via dopaminérgica e áreas límbicas. Isso ajuda na motivação, no humor e na regulação do estresse e da ansiedade.

  • Neuroplasticidade e conectividade cerebral: A música pode fortalecer e reorganizar conexões neurais, facilitando processos de aprendizagem, comunicação e adaptação.

  • Sistema de neurônios‑espelho: Atividades musicais como cantar, tocar instrumentos ou fazer ritmos estimulam sistemas de imitação e sincronização neural, importantes para percepção de intenções, empatia, comunicação não verbal e coordenação motora.

  • Redes de linguagem e comunicação: A música compartilha partes do processamento cerebral com a linguagem, facilitando o desenvolvimento de habilidades linguísticas, especialmente em quem tem atraso ou dificuldades de fala/linguagem.

Esses mecanismos não atuam isoladamente: a música normalmente ativa várias dessas vias ao mesmo tempo, o que torna sua ação terapêutica tão ampla e potente.

 

Por que esses mecanismos importam no neurodesenvolvimento

Para crianças e pessoas com transtornos do neurodesenvolvimento como o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), esses efeitos têm implicações diretas:

  • Muitas vezes há comprometimento na linguagem, comunicação social, regulação emocional, coordenação motora ou sensibilidade sensorial. A música entra como canal alternativo de expressão, comunicação e autorregulação, acessando áreas cerebrais preservadas.

  • A neuroplasticidade estimula a construção de novas conexões adaptativas. Favorecendo a aprendizagem, desenvolvimento de habilidades e reorganização de padrões neurais.

  • A ativação de sistemas de recompensa ajuda a tornar a terapia motivadora, prazerosa e recorrente — algo muitas vezes difícil em terapias “clássicas”.

  • A sincronia neural e o uso rítmico/motor contribuem para coordenação motora, imitação, atenção e integração sensorial, que são aspectos frequentemente desafiadores em TEA e outros transtornos de neurodesenvolvimento.

  • A música pode servir como ponte para linguagem, comunicação não verbal e socialização, especialmente em contextos onde a fala é limitada ou difícil.

Em resumo: a musicoterapia não trabalha apenas “um sintoma”, ela atua na criança como um todo (cérebro, corpo, emoção, socialidade), fazendo dela uma intervenção integradora e sensível à complexidade do neurodesenvolvimento.

 

Evidências científicas: musicoterapia em neurodivergência

Diversos estudos corroboram os efeitos da musicoterapia em populações com TEA ou outras condições de neurodesenvolvimento:

  • Uma revisão sistemática recente constatou que a musicoterapia ativa música‑making (produção ativa) resultou em melhoras significativas nas habilidades sociais de crianças com TEA. Além disso, houve impacto em marcadores biológicos de neuroplasticidade e estresse.

  • Um estudo de 8–12 semanas de intervenção musical relatou melhora na comunicação social e mudanças funcionais no cérebro em crianças com TEA.

  • Pesquisas apontam que a musicoterapia pode ativar o sistema de neurônios‑espelho, favorecendo imitação, empatia e aprendizagem social.
  • Intervenções musicais também mostraram promover regulação emocional, redução de ansiedade e melhoria no bem‑estar psicológico.

  • Há indicativos de que a música pode auxiliar funções cognitivas como atenção, memória e aprendizagem — aspectos centrais em diversos transtornos do neurodesenvolvimento.

Esses achados reforçam que a musicoterapia não é meramente recreativa, mas é uma intervenção com base neurocientífica, capaz de criar mudanças reais no cérebro e no comportamento.

 

Reconhecimento legal da musicoterapia no Brasil

Em outubro de 2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os planos de saúde devem cobrir sessões de musicoterapia para pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), desde que haja prescrição médica ou de profissional habilitado.

Essa decisão judicial reforça que a musicoterapia não é apenas uma atividade complementar, mas sim uma prática terapêutica reconhecida como necessária quando indicada clinicamente.

“A musicoterapia pode ser considerada tratamento de apoio à psicoterapia quando prescrita por profissional qualificado.” — Ministra Nancy Andrighi, STJ (Resp 2.058.043/SP, julgado em 25/10/2025)

A decisão judicial também destacou que a inclusão no rol da ANS não é excludente, e que o profissional assistente é quem detém a melhor capacidade de avaliar as necessidades da pessoa.

 

Como inserir musicoterapia em um plano terapêutico integrado

Para integrar a musicoterapia de forma responsável e eficaz:

  • Realize uma avaliação individualizada, considerando perfil sensorial, comunicação, interesses, postura motora, nível de tolerância a estímulos.

  • Combine musicoterapia com outras intervenções complementares (fonoaudiologia, terapia ocupacional, psicopedagogia, educação especializada), de modo interdisciplinar, aproveitando a música como facilitadora de linguagem, regulação e socialização.

  • Utilize atividades musicais ativas (cantar, tocar, ritmo), preferencialmente adaptadas aos interesses da pessoa, já que o envolvimento ativo fortalece neuroplasticidade e motivação.

  • Mantenha regularidade e consistência: a aprendizagem e reorganização cerebral se consolidam com repetição e tempo.

  • Observe os efeitos e registre progresso: mudanças na comunicação, interação social, autorregulação, comportamento e bem‑estar podem ser indicadores do impacto.

Dessa forma, a musicoterapia pode atuar como catalisadora de desenvolvimento e parte de um cuidado holístico e centrado na pessoa.

 

Limitações e cautelas

É importante considerar que:

  • Embora existam evidências promissoras, a musicoterapia não “cura” o neurodesenvolvimento. Ela apoia habilidades, estimula potencial e melhora qualidade de vida.

  • Os resultados variam muito entre indivíduos: cada pessoa neurodivergente tem um perfil sensorial, comunicativo e comportamental único.

  • A musicoterapia requer profissional habilitado, sensibilidade, adaptação e individualização.

  • A música deve ser usada com cuidado: volume, tipo de estímulo, preferência e contexto são importantes para evitar sobrecarga sensorial ou desconforto.

 

Conclusão e recomendações

A música não é apenas som ou arte, mas uma linguagem universal que dialoga diretamente com o cérebro, ativando redes de emoção, memória, movimento, cognição e socialidade. Por isso, a musicoterapia emerge como uma ferramenta poderosa para apoiar o desenvolvimento de pessoas neurodivergentes, oferecendo um caminho de comunicação, regulação, aprendizagem e bem‑estar.

Para profissionais de saúde, educação e famílias: considerar a musicoterapia como parte de um plano terapêutico integrado — com base em evidências e adaptado às singularidades — pode ampliar as possibilidades de desenvolvimento real e significativo.

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