O autismo tem sido tema alvo de estudos e pesquisas tanto pela área da saúde como da educação, com objetivo principal de auxiliar as pessoas diagnosticadas no espectro, tal como seus pais, responsáveis e educadores, a fim de que com a ampliação do conhecimento na área as intervenções possam ser aprimoradas, contribuindo para a evolução clínica no tratamento das pessoas com TEA (Pellicano & Houting, 2022; Almeida & Neves, 2020; Lord et al., 2020).
Todavia, grande parte desses estudos direcionam-se a uma fase do desenvolvimento específica: a infância. Não há como negar que a investigação e investimento, empírico e teórico, nesse período é de extrema importância, tendo em vista que o diagnóstico precoce favorece o início do tratamento e das intervenções na criança, aumentando assim as chances de evoluções em seu quadro clínico, porém ainda são poucos os trabalhos, em especial em âmbito brasileiro, que se dedicam especificamente a abordar as variações comportamentais e cognitivas do autismo na fase da adolescência (Lord et al., 2020).
Toda criança se torna adolescente e segue para a fase adulta, seguindo todas as fases dos desenvolvimento, bem como as novas demandas e desafios pertinentes a sua faixa etária (Sanini, Sifuentes & Bosa, 2013). Nesse sentido, é importante salientar que jovens típicos ou atípicos irão se modificar com o passar dos anos, porém há um indicativo, registrado na literatura, de que pais e responsáveis por jovens com TEA apresentem uma tendência maior a não compreender tal mudança, prolongando a infância e representando-os como crianças mesmo na adolescência (Serbai, Priotto & Palma, 2021; Minatel & Matsukura, 2014).
Os jovens que se encontram no espectro apresentam mudanças como quaisquer outros adolescentes, sendo elas alterações físicas, hormonais, comportamentais e emocionais, com destaque para temáticas que ainda são tabu para alguns, como sexualidade e relacionamentos amorosos (Brilhante et al., 2021). A socialização e comunicação também são apontadas como variáveis desafiadoras, muitas vezes pela inabilidade e ausência de tal repertório comportamental no jovem (Segeren & Françozo, 2014; Fernandes et al., 2014).
Nesse sentido, destaca-se a importância da avaliação, estimulação e desenvolvimento das habilidades sociais (HS) em tais adolescentes, promovendo a evolução e ampliação de habilidades como a comunicação assertiva, enfrentamento, compreensão de sentimentos, autonomia, assertividade, entre outros, que quando bem trabalhadas com jovens com autismo*, podem trazer ganhos significativos para as atividades de vida diária realizadas pelos mesmos, aumento a independência, capacidade de ampliação da interação social e alterações de determinados padrões de comportamento (Agostini & Freitas, 2022; Lord et al., 2020; Olivati & Leite, 2019; Maranhão & Pires, 2017; Sanini, Sifuentes & Bosa, 2013). Em virtude disso, é necessário que as fases da infância e adolescência sejam sempre bem divididas, pois cada uma delas contempla suas particularidades, desafios, bem como intervenções específicas e pertinentes.
Além disso, destaca-se a necessidade de maiores estudos e pesquisas que abordem a adolescência em pessoas com TEA, a fim de que as mesmas possam receber intervenções próprias para suas demandas e faixa etária, bem como tais contribuições teóricas servirem de alicerce para a profissionais, educadores, pais e responsáveis, bem como da própria comunidade científica.
* Salienta-se que cada indivíduo é único, tendo evoluções que podem variar, contudo destaca-se especialmente nesse trecho jovens que estejam nos níveis 1 e 2 do autismo.
Referências:
Agostini, J. M. G., & Freitas, L. C. (2022). Habilidades sociais educativas de pais de crianças com autismo: revisão de literatura. Psicologia Escolar e Educacional, 26.
Almeida, M. L., & Neves, A. S. (2020). A popularização diagnóstica do autismo: uma falsa epidemia?. Psicologia: Ciência e profissão, 40.
Brilhante, A. V. M., Filgueira, L. M. D. A., Lopes, S. V. M. U., Vilar, N. B. S., Nóbrega, L. R. M., Pouchain, A. J. M. V., & Sucupira, L. C. G. (2021). “Eu não sou um anjo azul”: a sexualidade na perspectiva de adolescentes autistas. Ciência & Saúde Coletiva, 26, 417-423.
Fernandes, A. D. S. A., Speranza, M., Mazak, M. S. R., Gasparini, D. A., & Cid, M. F. B. (2021). Desafios cotidianos e possibilidades de cuidado com crianças e adolescentes com Transtorno do Espectro Autista (TEA) frente à COVID-19. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 29.
Lord, C., Brugha, T. S., Charman, T., Cusack, J., Dumas, G., Frazier, T., Jones, E., Jones, R. M., Pickles, A., State, M. W., Taylor, J. L., & Veenstra-VanderWeele, J. (2020). Autism spectrum disorder. Nature reviews. Disease primers, 6(1), 5. https://doi.org/10.1038/s41572-019-0138-4
Maranhão, S. S. A., & Pires, I.A.H. (2017). Funções executivas e habilidades sociais no espectro autista: um estudo multicasos. Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento, 17(1), 100-113. https://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v17n1p100-113
Minatel MM, Matsukura TS. Famílias de crianças e adolescentes com autismo: cotidiano e realidade de cuidados em diferentes etapas do desenvolvimento. Rev Ter Ocup Univ São Paulo. 2014 maio/ago.; 25(2):126-34.
OLIVATI, A. G., & LEITE, L. P. (2019). Experiências acadêmicas de estudantes universitários com Transtornos do Espectro Autista: uma análise interpretativa dos relatos. Revista Brasileira de Educação Especial, 25, 729-746.
Pellicano, E., & den Houting, J. (2022). Annual Research Review: Shifting from ‘normal science’ to neurodiversity in autism science. Journal of child psychology and psychiatry, and allied disciplines, 63(4), 381–396. https://doi.org/10.1111/jcpp.13534
Sanini, C., Sifuentes, M., & Bosa, C. A. (2013). Competência social e autismo: o papel do contexto da brincadeira com pares. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 29, 99-105.
Segeren, L., & Françozo, M. D. F. D. C. (2014). As vivências de mães de jovens autistas. Psicologia em Estudo, 19, 39-46.
Serbai, F., Priotto, E., & PALMA, M. T. (2021). Autismo na adolescência uma revisão integrativa da literatura. Educação em Revista, 37.